José Alves de Azevedo



Tenho muito orgulho de ter o nome do Sr. José Alves de Azevedo. Meu avô foi e é um grande exemplo pra mim. A história dele é inspiradora e está diretamente ligada a do Cruzeiro Esporte Clube.


Texto de Luiz Carlos Rodrigues

Um Artífice da glória do Cruzeiro Esporte Clube. Quis o destino que eu fizesse da rua dos Guajajaras - Barro Preto meu mundo de criança e do campo do Palestra meu Lar. Assim, desde o idos de 1935, quando ainda florescia a Capital mineira, meu terreiro tinha os contornos do Estádio do futuro Cruzeiro Esporte Clube.

Assim, então, aprendi a amar tudo que povoava a vida do Clube Azul, que descendia de origens italianas mas se vitalizara na alma do povo brasileiro – aquela classe média, operosa e simples, que já assentava raízes em um Barro Preto que iniciava sua História.

Assim, também o Palestra que viria a chamar-se Cruzeiro Esporte Clube. E o meu coração se entregou a este Clube esportivo, hoje uma Instituição mundial. Mas ele se fez grande sem lances de heroísmos pugentes nem de heróis miraculosos. Sua grandeza foi plasmada no cotidiano, na simplicidade de um trabalho constante e reiterado, quase sempre anônimo, cuja somatória, ao correr do tempo, conferiu dimensão grandiosa, internacional, universal : um dos maiores clubes do mundo!

E nesta faina diária, no silêncio da simplicidade, quero destacar um nome de um artífice da Grandeza do Cruzeiro, para que, ante tanta modéstia, a História não venha a se omitir : José Alves de Azevedo.

Era eu criança, mais atento às coisas da idade mas já com visão abrangente do Cruzeiro, quando constatei a presença de um jovem, vindo do interior, da cidade de Luz, a integrar a equipe principal. Era o zagueiro Azevedo, um rapazinho que viera servir o Exército Brasileiro e se integrou ao Cruzeiro. Geraldo II, (Gerson, Bituca, Duque, muitos outros) e sempre o Azevedo formavam o trio final do Cruzeiro. Por muitos anos e com muitos títulos de campeão, especialmente o Tri de 42-43-44, sendo esta uma das mais brilhantes equipes da história do Clube.

Por muitos anos, com dedicação e eficiência técnica, Azevedo serviu às Cores-estreladas como atleta, em todas as posições, até mesmo como ponta-direita (não me esqueço). E sempre com ardoroso amor ao clube. Ninguém, nenhum atleta, se excedeu a ele pelo denodo, quase “raiva”, com que defendia seu Clube, num último eflúvio da era amadorista, embora já no profissionalismo. Atuou por várias décadas, recebendo um quase mínimo de sobrevivência e sem jamais fazer exigência salarial, mesmo porque não se poderia ver jogando por outro Clube. Lembro-me de quantas vezes atuou sem condições físicas, de joelho estourado, enrolado em joelheira que disfarçava a dor da séria contusão: e lutava como um bravo, dividia bolas, saltava e corria como se inteiro tivesse, pois o amor à causa esportiva superava a dor física. Isto é verdade.

Mas o molejar pela grandeza do Clube não ficou só no campo esportivo. Para complementar os parcos salários do futebol, veio a trabalhar na “Secretaria” do Clube, que não passava de uma modesta sala 4x4 onde estava tudo que dizia respeito à vida do Clube: Velhos livros de atas, inclusive da fundação; surrados arquivos onde eram guardados documentos; fichas de sócios, que restavam também sobre a mesa, pois não havia arquivo para guardá-las (o clube não podia gastar); contratos de atletas profissionais , guardados com critério absoluto para que não se perdesse o “direito ao passe”, o que jamais ocorreu face a responsabilidade do Azevedo). Ali se preservam os valores do Clube, pelas mãos zelosas do honrado guardião.

E seguia o ex-atleta, agora funcionário, altamente responsável, a servir com rigor de pontualidade, o destino do seu Clube. Impressionava-me a inexistência de horário de trabalho, pois sua jornada se iniciava pelas oito da manhã e às dez da noite ainda estava ele a mexer na sua “Secretaria”. De lá saía somente para dormir e fazer as refeições. A tal ponto que arranjou uma namorada na rua Guajajaras, a 20 ms. da sua Secretaria – a Celinha. Como não tinha tempo de “namorar”, comprou o Azevedo um toca-disco e ofertava, de longe, músicas românticas à amada. Não podia perder o tempo do Cruzeiro.

Azevedo tornou-se, assim, um polo que unia todos os que viriam a vincular-se ao Clube: recebia e dava recados e notícias, comunicava eventos, executava serviços externos, compras (e seu crédito ou seriedade pessoal funcionava também); em tempo de política interna, não se envolvia, a tudo assistindo com silêncio de uma estátua, mas se podia perceber que ele não se alheiava à disputa, fazendo juízo de valor sobre as questões e as pessoas envolvidas; de uma fidelidade absoluta ao seu Clube, para ele uma Instituição, uma causa, foi de honestidade absoluta.

Por todas estas razões, também por muitas desconhecidas e de seu temperamento, após abandonar o futebol e a ser tão somente funcionário-administrativo, Azevedo teve uma fase de certa agressividade, melhor diria, intolerância, talvez já enfastiado ou desgastado com o pouco reconhecimento financeiro que se lhe davam, ainda mais já com novas responsabilidades familiares, também com o acúmulo de trabalho e largo tempo sem descanso, pois jamais tirou férias. Foi quando o Conselheiro Dr. Josias Faria fez uma campanha para oferecer pelo menos uma casa ao incansável Azevedo, o que não sei se efetivado.

Continuava a faina de serviços de Azevedo, agora em fase mais estável e amena, fazendo de tudo, até mesmo decorações das festas juninas, lembrança que me ocorreu na última vez que estive no Barro Preto. Tornou-se um elo entre a “turma do Barro Preto” ou dos que por lá passavam fortuitamente. Todos lhe levavam “aquela” mais pura e mais antiga, que veio de longe, que não está à venda, muito especial, que ele distribuia em goles ao mais privilegiado. A certa altura, quem pretendia fazer uma “fezinha” no bicho, podia driblar a Polícia com a ajuda gostosa do Azevedo. Tudo para servir aos amigos. E eu, na última hora do dia 23 de dezembro de 1948, véspera do Natal, arrisquei o número de uma ficha que estava sobre a mesa do Azevedo: 1307. E deu na cabeça. Agora, na minha casa pobre e modesta ia haver ceia de Natal.

Ganhei duas vezes na Loteria : uma no milhar; outra em ter convivido e ser amigo de José Alves de Azevedo, um nome que se integra à História do Cruzeiro Esporte Clube.

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